A menina esticava a massa contra a janela procurando transparência. Ela sovava e suava, torcia e se contorcia tentando acertar. Espreguiçava a mistura sobre a pia, estirava o máximo que podia. Às vezes a massa rasgava de fina, antes de ficar transparente, e ela tinha que recomeçar.
Era a avó quem enxergava além do que a menina conseguia e cobrava o ponto certo da massa, que só ela sabia. A pele manchada e os dedos calejados disfarçavam a autoridade daquelas mãos, quando demonstravam a maestria em amassar, untar e assar. Era tão sabida a senhora, que não dava conta de ensinar. Era uma cozinheira de mão cheia e gostava que aprendessem com ela, adoraria encher as mãos da filha e da neta com suas receitas de família. Mas ensinar e aprender são trabalhos de personalidades próprias que nem sempre caminham juntos. Uma achava que ensinava, mas a outra não aprendia. Uma sonhava aprender, mas a outra não transmitia.
– Vovó, falta açúcar? Chega de sova?
– Você tem que sentir, minha filha.
E ela sentia que nunca aprenderia…
Mas insistiu por amor a avó e ao perfume das maçãs no forno, da manteiga começando a derreter, do açúcar que polvilhava aquele momento.
Há muita fome para desvendar o que leva alguém a aprender. Conhecer os ingredientes que despertam atenção e levam à emoção é o segredo da receita.
A neurociência está convencida de que “só se aprende aquilo que se ama”, expressão título do livro de Francisco Mora, especialista no assunto. Ele alega que “é necessário despertar a curiosidade, acender uma emoção para armazenar e recordar de uma forma mais eficaz”. E conclui: “os elementos desconhecidos, que nos surpreendem, são aqueles que abrem a janela da atenção, imprescindível para a aprendizagem”.
Mais de cinquenta anos mais tarde, a menina ainda sente a boca aguando e ainda está em busca da transparência da massa à luz da janela. Reencontra com a avó em cada dentada de applestrudel e aproveita para perguntar como abrir a massa à perfeição.
Ela não sabe que já aprendeu.